12 de dezembro de 2007

SDT UTILIDADE PÚBLICA: UMA CAMPANHA NOBRE

Sou totalmente a favor, desde que para fins pacíficos e humanitários, da completa descriminalização do genocídio que almeje eliminar da face da Terra a raça dos donos de celulares com toque engraçadinho e que põem um meio-sorriso estúpido no rosto ao atender o aparelho.

Entre você também em mais esta cruzada cívica patrocinada pelo SDT, leitor.

O MEIO-SORRISO-ESTÚPIDO-DO-DONO-DE-CELULAR-ENGRAÇADINHO: PEQUENO INFORME SOBRE UMA EXPRESSÃO HUMANA QUE JAMAIS SERÁ REPRODUZIDA POR UM ROBÔ

A TV mostrou, não faz tempo, na série "Mundos Invisíveis", no Fantástico, o comovente esforço de cientistas japoneses que tentam reproduzir, na face de um robô, expressões humanas.

Digo "comovente" porque a causa é nobre: os cientistas estão, na prática, preparando robôs que, com toda certeza, serão uma companhia mais agradável, menos barulhenta e menos inconveniente do que noventa e oito vírgula nove por cento dos seres humanos.

Um mecanismo instalado dentro do robô distende ou retrai o rosto do bicho, feito de matéria plástica. Assim, o rosto passa a demonstrar "sentimentos" como espanto, alegria e tristeza.

Os cientistas podem suar seus jalecos durante décadas nos laboratórios de robótica, mas jamais conseguirão sucesso total na empreitada. Pelo seguinte: há uma expressão humana que é absolutamente irreproduzível por robôs.

Preste toda atenção. Há uma fila de espectadores esperando a hora de entrar na sala do cinema.
De repente, um celular começa a emitir musiquinhas engraçadinhas.

O dono do celular bota a mão no bolso e atende.

Aquela ar de completa idiotia que o dono do celular exibe enquanto tateia o aparelho no bolso jamais será reproduzido por um robô: é um meio-sorriso estúpido que desmente todas as teorias sobre a evolução da espécie.

O dono do celular que emite ruidinhos e musiquinhas supostamente engraçadinhos tenta mostrar, aos passantes, que é um sujeito esprituoso. Quá-quá-quá.

Podem juntar todos os PHDs do Japão, todos os gênios do MIT, todos os nerds de todas as escolas suíças: nunca, jamais, em tempo algum a ciência poderá reproduzir o meio-sorriso estúpido-dos-idiotas-donos-de-celulares-com-musiquinha-engraçadinha-na-fila-do-cinema.

Leonardo Da Vinci não ousaria reproduzir numa tela movimento tão perfeito. O sorriso da Monalisa é obra de amador.

O meio-sorriso-estúpido-dos-idiotas-donos-de-celulares-com-musiquinha-engraçadinha-na-fila-do-cinema é uma criação essencialmente humana; uma obra-de-arte perfeita porque retrata, sem retoques, a essência do espírito de quem o ostenta.

Nenhum artista, nenhum cientista jamais ousaria recriá-lo.

Cientistas, recolhei seus robôs. Pintores, aposentem seus pincéis. Não adianta: a originalidade da idiotia humana é irreproduzível.

E assim será, por séculos e séculos. Não há avanço possível: a civilização estancou ali, no meio-sorriso-do-idiota-do-celular-de-musiquinha-engraçadinha.

E dali não avançará.

PULHAS

Assim falava Moraes Neto:

"Conselho desinteressado de uma ruína quase cinquentenária (o locutor que vos fala): não levem a sério gente que, para parecer importante, vive arrotando suposta intimidade com personalidades importantes. São uns pulhas, na maioria dos casos. É melhor pedir a conta, dar uma gorjeta ao pianista, fechar a porta e ir embora em silêncio."

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A PROPÓSITO DE DUCHAMP

Fico imaginando a máxima duchampiana de que arte é tudo aquilo que se chama de arte - peça de engodo que faz a cabeça vazia de onze em cada onze artistas plásticos e subletrados em geral - aplicada ao humor. “Humor é tudo aquilo que o sujeito chama de humor”, diria um seguidor do homem do penico, caso soubesse o que significa a palavra.

Então, estudantes de sociologia com suas bolsas de couro e sandálias de dedo entrariam numa galeria repleta de pedaços de lixo, garrafas, vibradores enfiados em torradeiras enferrujadas, anões mancos copulando com obesas paralíticas e outras atrações comumente expostas em bienais, mas em vez de porem caras de mais burros tentando parecerem eruditos, cairiam no chão, embolando de rir. E comentariam ao final: “Aquele acordeão furado sobre o banquinho com pintas roxas estava hilário".

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