23 de novembro de 2007

Nome é destino (é o que eu sempre digo)

Vocês devem ter lido, mas, mesmo assim, passo aqui rapidamente, pois ainda estou de recesso devido a minha mudança para Lisboa, para comentar a seguinte matéria publicada na Folha (assinante) de quinta-feira:

Bolsistas brasileiros em ato pró-Chávez

A manifestação a favor da reforma constitucional teve ontem o reforço de um ruidoso grupo de universitários brasileiros que estuda na Venezuela com bolsas de estudos do governo Hugo Chávez. Com uma bandeira brasileira para se abrigar do sol e uma batucada improvisada, os cerca de 20 estudantes traziam também bonés, camisetas e bandeirolas dos movimentos sociais às quais pertencem, como o MST e o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), todos ligados à Via Campesina, movimento internacional que reúne organizações pró-reforma agrária. “Estamos aqui porque apoiamos o processo e vamos contribuir com o que for possível”, diz a estudante de medicina Lucicléia Soares, 21, de Conceição do Araguaia (PA), filiada ao Movimento de Mulheres Camponesas (MMC). “A soberania tem de estar no povo. Se o povo quiser, tira o Chávez”, diz a colega Vaubéria Macêdo, 22, ao defender o ponto mais debatido da reforma, a reeleição indefinida para presidente. Originária de Nova Olinda (CE) e ligada à Pastoral da Juventude Rural, ela acha que o presidente venezuelano precisa de mais tempo: “As pessoas que apóiam o capitalismo ainda estão muito fortes, a revolução precisa de tempo”. Lucicléia e Vaubéria contam que chegaram a Caracas há sete meses para estudar medicina na Escola Latino-Americana de Medicina (Elam), projeto criado em Cuba. O grupo conta ao todo com 66 brasileiros. Todos recebem uma bolsa integral do governo venezuelano e devem ficar no país durante os sete anos do curso.

Nosso grande filósofo Nelson Rodrigues estava certíssimo: nome é destino. Eu fiquei tentado a simplesmente escrever: mas se eu me chamasse Lucicléia ou Vaubéria também devotaria minha vida a causas ignóbeis, como uma reação ao trauma de ter recebido tais nomes. Mas isso não seria justo com as outras Lucicléias ou Vaubérias (será que existem outras?) que nunca apoiariam um aspirante a ditador (”tá de sacanagem, aspira?”), mesmo que financiada por alguns tostões que lhes garantissem os estudos.

As duas moças recebem para estudar o que grande parte da população venezuelana não ganha trabalhando duro. O que é pior: essa parte da população que trabalha duro - e cujos filhos, muitas vezes, não pode freqüentar uma universidade por falta de grana - financiam as brasileirinhas que nunca pagaram um vintém na Venezuela. É justo?

O povo da Venezuela podia exigir que os estrangeiros que fossem no país estudar com bolsa dediquem alguns anos de suas vidas atendendo gratuitamente a população que bancou suas faculdades. Mas sabem o que vão fazer as brasileirinhas após a formatura? Voltar para o Brasil, certamente, abrir seus próprios consultórios e, horror! horror!, se integrarem ao capitalismo que tanto odeiam.

Lucicléias ou Vaubérias, tanto faz, se nome é destino, façam que seus destinos não sejam equivalentes a seus nomes.

(PS: Volto à labuta blogal no dia 1 de dezembro)