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A edição de domingo do jornal O Estado de S.Paulo, "Estadão" para os íntimos, é uma das (poucas) coisas boas da imprensa brasilíndia, porque investe, por exemplo, em grandes reportagens. Tive a péssima idéia de fazer uma assinatura de fim-de-semana do jornal. Ou seja: somente para os sábados e domingos. Fui obrigado a cancelar a mini-assinatura porque o Estado de S.Paulo deve ter escolhido a pior empresa de entrega do Cone Sul para fazer este serviço no Rio de Janeiro. Perdi a conta de quantas vezes fiquei a ver navios. Péssimo serviço. Chega. Basta.
Pior do que o serviço de entrega carioca do Estado de S.Paulo só a campanha publicitária do jornal. O que é aquilo, meu Deus do céu ? Quem foi o gênio que inventou aquele slogan que diz que o Estadão é o jornal de quem "pensa Ão" e não de quem "pensa Inho" ?
"Pensa Inho" ? "Pensa Ão" ?
O slogan pretensamente criativo soa como a tricentésima tentativa de publicitários de criar pseudo-bordões que nunca, jamais, sob hipótese alguma, cairão na chamada "boca do povo".
Porque somente um idiota em último grau seria capaz de falar assim : "Fulano desistiu de viajar. Acho que ele pensa inho". Ou: "Sicrano pediu demissão do emprego. Acho que ele pensa ão".
(Parece até aqueles anúncios de cerveja supostamente engraçadinhos, mas na verdade ridiculamente patéticos e irritantes, como os que falam em "bar da boa" e "ponto").
O triste é que publicitários vivem dizendo, a sério, que os anúncios brasileiros estão entre os melhores do mundo.
A gente fica imaginando: se é assim no Brasil, como não será no Paraguai, no Sudão, em Angola, na Bolívia ?
O patetice do "ão" e "inho" me lembra de uma das maiores aberrações impressas que já vi: por coincidência, um anúncio do próprio Estado de S.Paulo, publicado há anos na revista "Imprensa", trazia, clara, indiscutível, indesmentível, uma vírgula entre sujeito e verbo. Não me lembro qual era a frase inteira, mas havia, com cem por cento de certeza,uma vírgula entre a palavra "Estadão" e o verbo, no slogan publicitário.
Fiquei pensando: se uma agência de publicidade cria e um grande jornal aprova um anúncio que traz o mais primário dos erros, a caminhada da língua rumo ao brejo é irreversível. Já se disse que tratar a língua a pontapés é o primeiro sinal
da falência generalizada. Deve ser. Um advogado analfabeto querendo escrever difícil; um cantor de pagode; um artista que usa bandana ou tiara; um praticante de badminton; gente assim pode cometer gigantescas vírgulas entre sujeito e verbo, mas quem usa a língua como instrumento diário de trabalho não pode.
Eu me lembrei dessas aberrações publicitárias ao ver, esta semana, um anúncio de página inteira da Associação Brasileira de Propaganda ( publicado, por exemplo, na edição de terça-feira de O Globo). O texto principal dizia: "Quem não evoluiu como o consumidor, se limitou a ficar velho como a censura". Lá estava de novo a vírgula entre sujeito e verbo. Não sou, óbvio, especialista em língua portuguesa, devo cometer minhas barbaridades, mas se o sujeito é "quem não evoluiu como o consumidor", então não existe esta vírgula. Um anúncio assinado pela Associação Brasileira de Propaganda....
Diante do festival de pretensão descabida, erros primários e tentativas desastrosas de fazer gracinha, pergunta-se : por que é que a publicidade brasileira não apaga tudo e começa do zero ?
Eis, aí, o tema de uma boa campanha : "Brasil : chegou a hora de começar do zero !".