15 de agosto de 2007

Joel Silveira, ou o mundo que acaba não com uma explosão, mas com um lamento

Parece que nasci lendo Joel Silveira. Não lembro quando comecei e o fato é que seus livros me acompanham, quero dizer, eu acompanho seus livros. As histórias que escreveu estão gravadas em minhas retinas ainda não fatigadas. Seu humor era um modelo de estilo que em vão tentei imitar. Ele era pessoal até a medula sem nunca, pelo que eu me lembre, usar o “Eu” (e digo logo que não vejo qualquer problema no uso do “Eu” num texto, desde que bem escrito, né?). O texto dele era reconhecível a quilômetros.

A história que imediatamente lembro e divulgo à boca grande ao surgir o nome do jornalista numa conversa é aquela em que ele, logo depois de ser escolhido enviado especial à Itália para cobrir a segunda guerra, vai conversar com Chatô, o dono dos Diários Associados. E daí Chatô diz: “Ô seu Joel o senhor vai lá cobrir a guerra, mas, não vá me morrer, hein, seu Joel! Repórter é para mandar notícias, não para morrer! (não lembro se foram exatamente essas palavras, mas assim fica bom).

Recorrendo outra vez à minha memória, que é péssima e estou sem acesso aos meus livros, tem outra história fantástica, quando Joel e um colega jornalista foram entrevistar, nos anos 1950 se não me engano, um ditador de um país da América Central, que acho que a República Dominicana. À espera do ditador na monumental sala, os dois são extremamente bem-tratados, com quitutes, acepipes e bebida farta. Eis que chega o ditador, todo afagos e sorrisos, e a conversa avança. Lá pelas tantas, entra sala adentro em desabalada carreira uma criança lépida e fagueira. Abraçou o ditador, que se abria mais ainda em sorrisos e afagos. Assim que a criança deixou o recinto, Joel, querendo ser gentil, lascou essa:

- ¿Su nieto, presidente?

O ditador, com cara de general em campo de batalha, levantou-se, olhou para Joel e torpedeou:

- Mi hijo!

Mal a frase saiu da boca, o homem já ordenava aos jornalistas que deixassem o recinto, a conversa acabava ali. O ditador admitia poucas coisas, o que não incluía ser chamado de avô do filho.

Joel fica pelo texto, pelo humor, pelo trabalho notável como jornalista, pela vida, pela ética, pelo uísque, que volta a ser compartilhado com Rubem Braga.

(Especial sobre Joel Silveira em Bruno Garschagen)