Se os jornais argentinos recorrem ao surrealismo para explicar aos seus leitores o Brasil e o caos aéreo, o jornal francês Le Figaro (edição de ontem), eterno porta-voz da direita francesa, assegura que "o Brasil governado pelo ex-metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva é o “paraíso dos ricos”. O Figaro informa que São Paulo já tem sete shoppings de luxo e em breve terá mais três, com helipontos para conforto dos milionários. Destaca que, se a economia cresceu 3,7% no ano passado, o segmento de luxo registrou expansão de 32%: “as fortunas brasileiras souberam tirar proveito da política econômica do governo Lula. Para conter a inflação, ele tem mantido as taxas de juros em níveis astronômicos, fazendo a alegria do setor financeiro”.
Ao contrário da classe operária, são os ricos que desfrutam do paraíso brasileiro para inveja da direita francesa. Como têm à disposição a frota de helicópteros e jatinhos executivos, o Brasil surrealista, analisado pelos argentinos, não os interessa nem os incomoda. A massa bruta, anestesiada com o bolsa-família, se mantém obviamente alheia aos problemas estruturais e de gestão do país. A classe média, orfã e fora do jogo político, vive calcinados dias de pânico e apoplexia.
Para o paraíso ficar ainda mais aprazível só faltaria garantir o terceiro mandato. Dinheiro não seria problema para investir na aventura constitucional . Mas aí aparece, de vez em quando, um poema sonoro no Maracanã, uma falta de grooving em São Paulo, um atentado lingüístico grampeado de um aloprado, uma ministra excitando lubricamente passageiros refugados, um grupo de exportadores incomodado com a vertigem do dólar, e pode estragar a festa do "queremismo". Os ricos das páginas do Le Figaro estão se perguntando, desde já: será que acharemos no ABC outro mano metalúrgico tão altruísta? Afora Adão e Eva, se desconhece quem tenha sido expulso do paraíso. Portanto, é claro que os milionários da era daslu-lulista já iniciaram a busca. Frei Betto bem que poderia prestar-lhes uma consultoria.